sexta-feira, 2 de novembro de 2012

O amigo e o bajulador


Bajulador é um dos 83 textos que compõem a obra de Moradia, escrita pelo extraordinário pensador grego Plutarco (47/120 d.C) nascido na cidade de Queronéia, na Beócia, e por lá viveu até o fim de sua existência.

O amigo é aquele que nem sempre aprova tudo que fazemos. Já o bajulador é aquele que sempre simula sua mudança de opinião, demonstrando com extrema clareza que suas opiniões são volúveis e interesseiras. Uma outra habilidade do bajulador é sempre tentar destacar, invariavelmente em público, aquele a quem desejar agradar. É a parte constitutiva da essência do bajulador o excesso de exposição. Seu comportamento é duplo, e sempre serve a quem pode satisfazer os seus desejos, não se importando em ceder seu lugar a um poderoso, desde que este retribua dando-lhe em contrapartida aquilo que é o seu objeto de desejo.

O bajulador jamais consegue enxergar as coisas na sua totalidade ou em sua essência. No seu modo de entender, bastam os detalhes. O bajulador é aquele que promete e nunca é capaz de fazer. Já o amigo nunca promete nada e sempre tenta, quando possível, ajudar.

O bajulador necessita aparecer, sempre deseja opinar, enquanto o amigo opina quando é solicitado a fazê-lo.

O texto de Plutarco é de uma enorme vitalidade. Apesar de toda distância temporal e cultural, apresenta grandes semelhanças com o nosso tempo atual. São muitos os momentos em que podemos claramente notar os traços da bajulação na nossa sociedade.

Qualquer esfera que envolva poder, decisão ou prestígio proporciona o aparecimento da bajulação e do bajulador. Quer nos escândalos governamentais, quer em relações banais, a bajulação e a vaidade sempre estão a nos espreitar. Temos casos reais no nosso dia a dia.

Por isso, resta a cada um de nós a capacidade de distinguir entre amigos e bajuladores, elegendo, por meio da força da nossa vontade ética, aquilo que sempre preferimos.

Que bom seria se nossos governantes estivessem atentos ao que escreveu Plutarco, há tantos séculos.

Escândalos tenebrosos e finais desastrosos teriam e poderiam ter sido evitados em muitos países, incluindo o nosso.

Contra os excessos, segundo Plutarco, o amigo caracteriza-se pelo uso de franqueza, embora não se deva aqui confundir franqueza com indelicadeza, pois esta nada produz de frutífero numa relação de amizade. Deve-se, portanto, observar os dois tipos de excesso: o da bajulação e o da franqueza destruidora. É interessante perceber que, no entender de Plutarco, o amigo é como um verdadeiro e bom médico, alguém que sabe a exata medida de sua atuação.

A antiga medicina grega afirmava que a saúde residia exatamente no equilíbrio entre as coisas. Por isso o amigo deve ser sempre franco e jamais repreender em público, e deve esperar o momento certo para fazer suas observações.

Aquele que humilha não produz nada de bom na relação; pelo contrário, acaba por destruí-la, colocando-se, assim, a amizade nas mãos dos bajuladores. O triste de tudo isso é que vivemos em uma sociedade de poucos amigos e vários bajuladores.

Para muitos, o grande amigo é aquele que possui o poder nas mãos, e não aquele que te ama e respeita como você é. O bajulador é aquele que adora ser colunável, adora dizer o que pode comprar, mas esquece de dizer que não pode pagar.
Fonte: DN Opinião ( por Rossana Koepf - Advogada e psicanalista)

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